O que são os anjos e arcanjos

O que são anjos

O conceito de anjo, como ser intermediário entre a Divindade e a humanidade, é uma constante em diversas tradições religiosas e filosóficas. Para uma análise precisa, é necessário examinar sua evolução etimológica, seu desenvolvimento dentro de contextos históricos específicos e sua aplicação sistemática em tradições esotéricas.

Guia dos 72 anjos cabalisticos

Definição Etimológica e Função Primordial

A palavra “anjo” deriva do latim angelus, que translitera o grego ángelos (ἄγγελος). Ambos os termos são traduções do hebraico mal’akh (מַלְאָךְ). O significado fundamental e consistente em todas essas línguas é “mensageiro”. Esta definição estabelece a função primária do anjo: um emissário da Vontade Divina, desprovido de livre-arbítrio autônomo e agindo como um executor de decretos superiores. Em sua concepção original, eles não são deidades, mas sim extensões funcionais do poder de um Deus único.

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Evolução no Pensamento Judaico: Da Torá ao Período do Segundo Templo

Nos textos mais antigos do Tanakh (a Bíblia Hebraica), particularmente na Torá, os anjos aparecem de forma funcional. Em passagens como Gênesis 18, eles assumem forma humana para comunicar mensagens divinas a Abraão. Sua natureza celestial é secundária à sua função de mensageiros.

Durante o Período do Segundo Templo (c. 516 a.C. – 70 d.C.), sob a influência de cosmologias persas (Zoroastrismo) e babilônicas, a angelologia judaica expandiu-se significativamente. Textos apócrifos e pseudepígrafos, como o Livro de Enoque, apresentam uma hierarquia celestial complexa, com anjos nomeados e encarregados de governar os elementos naturais e os corpos celestes. É nesse período que figuras como Michael, Gabriel e Raphael, mencionados em textos canônicos como o Livro de Daniel e o deuterocanônico Livro de Tobit, ganham proeminência como entidades com funções bem definidas.

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A Sistematização na Cabala

Na Cabala, a tradição mística do Judaísmo, o conceito de anjo atinge sua máxima sofisticação. Textos fundamentais como o Zohar descrevem o universo como uma série de emanações divinas (as dez Sephirot). Os anjos são as inteligências ou forças operacionais que administram as leis cósmicas dentro dessa estrutura emanacionista. Eles são vistos como “feixes” de energia divina, cada um incorporando uma virtude ou poder específico.

É dentro deste sistema que o conceito dos 72 Anjos do Shem HaMephorash é formalizado. Baseado em uma exegese dos versículos 19, 20 e 21 do Capítulo 14 do Livro do Êxodo, os cabalistas derivaram 72 Nomes de Deus de três letras. Ao adicionar os sufixos divinos “-El” ou “-Yah”, formaram os nomes dos 72 anjos. Cada anjo governa um período de cinco dias do ano e possui atributos específicos, funcionando como chaves para acessar aspectos particulares da consciência divina.

Integração nas Tradições Esotéricas Ocidentais

O conhecimento cabalístico sobre anjos foi uma fonte primária para o esoterismo ocidental. O Hermetismo, baseado em textos como o Corpus Hermeticum, fundiu a angelologia com a astrologia, vendo os anjos como as inteligências ou “governadores” das esferas planetárias. O princípio hermético “Assim como é em cima, é embaixo” implica que compreender e interagir com essas inteligências celestes permite ao adepto influenciar a realidade terrena.

A Alquimia, em sua vertente espiritual, também incorporou essa visão. A transmutação dos sete metais clássicos era associada aos sete planetas da antiguidade, cada um governado por um arcanjo. A Grande Obra alquímica não era apenas um processo físico, mas uma jornada espiritual que exigia a cooperação dessas inteligências angélicas para purificar a matéria e, por analogia, a alma do alquimista.

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A Hierarquia Celeste: Uma Análise Estrutural dos Nove Coros Angélicos

A concepção de uma hierarquia celestial, na qual os seres angélicos são organizados em ordens ou “coros” distintos, é um dos pilares da angelologia clássica. Embora referências a diferentes tipos de anjos existam em textos bíblicos, a sistematização mais influente para o pensamento ocidental foi formalizada no século V ou VI por um autor neoplatônico que escreveu sob o pseudônimo de Dionísio, o Areopagita.

Em sua obra fundamental, “A Hierarquia Celeste” (De Coelesti Hierarchia), ele delineou uma cosmologia precisa onde a proximidade com Deus determina a natureza e a função de cada ordem angélica.

Esta hierarquia é estruturada em três esferas ou tríades, cada uma contendo três coros. A Primeira Tríade (Serafins, Querubins, Tronos) existe na contemplação direta e incessante da Divindade, absorvendo e refletindo as emanações divinas em sua forma mais pura.

A Segunda Tríade (Dominações, Virtudes, Potestades) atua como a governança celestial, traduzindo os planos divinos em princípios de administração universal.

A Terceira Tríade (Principados, Arcanjos, Anjos) é a esfera executora, interagindo de forma mais direta com o plano material e a humanidade. A seguir, analisaremos detalhadamente a função e os atributos de cada um dos nove coros.

A Primeira Tríade: Conselheiros Celestiais

Esta esfera representa os anjos que habitam na presença imediata de Deus, cuja existência é um ato de pura adoração e contemplação.

Serafins

O termo “Serafim” (plural, Serafins) deriva do hebraico saraph (שָׂרָף), que significa “ardente”, “queimar” ou “serpente de fogo”. Esta etimologia aponta diretamente para sua natureza, descrita como a da mais intensa e pura luz e amor. Segundo Dionísio, os Serafins são a ordem mais elevada, circulando perpetuamente em torno do Trono de Deus em um movimento incessante de amor divino.

Sua função não é de mensageiros para a humanidade, mas de absorver e transmitir a primeira e mais potente emanação divina — a essência do amor incondicional e da existência pura — para os coros inferiores.

A principal referência bíblica para os Serafins encontra-se em Isaías 6:1-3, onde o profeta descreve sua visão do Templo: “Eu vi o Senhor assentado sobre um alto e sublime trono… Serafins estavam por cima dele; cada um tinha seis asas; com duas cobriam os seus rostos, e com duas cobriam os seus pés, e com duas voavam. E clamavam uns aos outros, dizendo: Santo, Santo, Santo é o Senhor dos Exércitos; toda a terra está cheia da sua glória.” Esta passagem define seus atributos: as seis asas simbolizam sua transcendência e prontidão, e seu canto (“Santo, Santo, Santo”) é a própria vibração que estabelece a ordem divina no cosmos.

Na Cabala, os Serafins são associados à Sephirah mais elevada da Árvore da Vida, Keter (a Coroa), que representa a consciência pura e a unidade primordial com a fonte divina. Eles são, portanto, a manifestação da Vontade Divina em seu estado mais indiferenciado e potente, a chama que inicia todo o processo criativo.

Querubins

O segundo coro, “Querubim” (plural, Querubins), tem origem no hebraico keruv (כְּרוּב). Embora sua etimologia exata seja debatida, a tradição a associa frequentemente ao acadiano karibu, que significa “abençoar” ou “orar”, e a tradição talmúdica a interpreta como “plenitude de conhecimento”.

Dionísio os posiciona como os guardiões da Sabedoria Divina. Enquanto os Serafins contemplam o amor de Deus, os Querubins contemplam a Sua sabedoria e conhecimento. Sua função é guardar os mistérios celestiais e os registros divinos.

A referência bíblica mais antiga está em Gênesis 3:24, onde, após a expulsão de Adão e Eva, Deus “pôs querubins ao oriente do jardim do Éden, e uma espada inflamada que andava ao redor, para guardar o caminho da árvore da vida.” Esta função de guardiões é reforçada na visão de Ezequiel 10, onde são descritos como seres complexos de quatro faces, cobertos de olhos, que sustentam o trono-carruagem (Merkabah) de Deus, simbolizando a onisciência e a presença divina em todas as direções.

Na Cabala, os Querubins estão associados à segunda Sephirah, Chokmah (Sabedoria). Eles recebem a pura luz de Keter e a transformam no primeiro impulso de intelecto e sabedoria, o plano arquetípico de toda a Criação. Eles não apenas conhecem a Vontade Divina; eles a compreendem em sua totalidade, sendo os guardiões da estrutura e do plano cósmico.

Tronos

O terceiro coro, “Tronos”, deriva do grego Thronoi (Θρόνοι) e está diretamente ligado ao conceito hebraico de Ophanim (אוֹפַנִּים), que significa “rodas”. Sua descrição provém da mesma visão de Ezequiel 1 e 10, onde são as “rodas dentro de rodas”, cheias de olhos, que se movem em perfeita harmonia com os Querubins.

Segundo Dionísio, os Tronos são o símbolo da Justiça e da Estabilidade Divina. Eles estão livres de qualquer paixão ou tentação material, e sua função é servir como o “assento” ou o fundamento da presença de Deus. Eles não executam a justiça, eles são a personificação da imutabilidade do julgamento divino.

Sua missão é traduzir a sabedoria contemplada pelos Querubins na primeira forma de lei universal e estrutura cósmica. São eles que mantêm a estabilidade do universo, garantindo que a Vontade Divina se manifeste como uma ordem justa e inabalável.

Na Cabala, os Tronos são associados à terceira Sephirah, Binah (Entendimento). Binah é o grande útero cósmico que recebe a semente da sabedoria de Chokmah e lhe dá forma, estrutura e lei. Assim, os Tronos são a manifestação da inteligência divina que estrutura a Criação, estabelecendo as leis físicas e metafísicas que a governam.

A Segunda Tríade: Governadores Celestiais

Esta esfera atua como a administração do universo, recebendo os planos da Primeira Tríade e organizando-os para a execução.

Dominações

As “Dominações” (Dominationes em latim, do grego Kyriotetes, “Senhorios”) são a primeira ordem da segunda tríade. Mencionadas em textos como Colossenses 1:16, sua função, segundo Dionísio, é a de governar e regular as tarefas dos anjos inferiores. Eles são os “gerentes” ou “administradores” celestiais, que recebem as ordens dos coros superiores e as delegam de forma organizada.

As Dominações asseguram que a ordem cósmica seja mantida, supervisionando o trabalho dos anjos que governam as nações e os processos naturais. Eles raramente interagem diretamente com os humanos, pois sua esfera de atuação é a macrogestão do universo. Sua principal virtude é a liberdade da servidão; eles servem a Deus por puro amor à ordem, não por obrigação, e inspiram essa mesma liderança justa nos anjos abaixo deles.

Na Cabala, são frequentemente associados à Sephirah Chesed (Misericórdia ou Graça), que representa a organização expansiva, a legislação e a estruturação benevolente da realidade. Eles garantem que o universo funcione de maneira ordenada e justa, manifestando a misericórdia de Deus através de uma administração perfeita.

Virtudes

O coro das “Virtudes” (Virtutes em latim) tem um nome que pode gerar confusão. Deriva do grego Dynameis, que significa “poderes” ou “forças”. Sua função principal é a de canalizar a energia divina para o plano material. São eles os responsáveis por operar os “milagres” e por manter as leis da física em funcionamento.

Quando uma intervenção divina que parece suspender a ordem natural ocorre, são as Virtudes que a executam. Elas infundem coragem e força nos seres humanos em momentos de grande dificuldade, permitindo-lhes superar seus limites. São os executores da causalidade, os mantenedores do movimento dos corpos celestes e de todos os processos energéticos do universo.

Na Cabala, as Virtudes estão ligadas à Sephirah Geburah (Força ou Julgamento). Geburah é a energia da disciplina, do poder e do rigor, que contrai e direciona a força expansiva de Chesed. As Virtudes, portanto, aplicam o poder divino de forma focada e precisa para manter a ordem e executar as mudanças necessárias no tecido da realidade, manifestando a força de Deus.

Potestades

As “Potestades” (Potestates em latim), do grego Exousiai (“Autoridades”), formam o último coro da segunda tríade. Sua função é uma das mais críticas: manter o equilíbrio cósmico e proteger a fronteira entre o plano divino e as forças astrais inferiores.

São os grandes guerreiros do exército celestial, cuja principal tarefa é combater as influências de entidades espirituais negativas. Eles são os guardiões da consciência coletiva da humanidade, protegendo-a de infestações demoníacas ou de ideologias destrutivas. Mencionados em Efésios 6:12 como os poderes contra os quais a humanidade luta, as Potestades não apenas combatem o mal, mas também presidem sobre a distribuição de poder e autoridade entre os seres humanos.

Na Cabala, estão associadas à Sephirah Tiphareth (Beleza ou Harmonia). Tiphareth é o centro de equilíbrio da Árvore da Vida, o ponto que harmoniza as forças opostas de Chesed e Geburah. As Potestades, portanto, agem para manter esse equilíbrio, garantindo que o mal não prevaleça e que a harmonia seja a nota dominante no universo.

A Terceira Tríade: Mensageiros e Ministros

Esta é a esfera que interage mais diretamente com a humanidade, executando os planos divinos no mundo material.

Principados

Os “Principados” (Principatus em latim), do grego Archai (“Princípios” ou “Governantes”), iniciam a terceira tríade. Sua função é a de governar e inspirar os grupos humanos em grande escala, como cidades, nações e culturas.

Eles supervisionam a implementação dos decretos divinos na história humana, influenciando líderes e governantes a tomar decisões que estejam alinhadas com o plano cósmico. Eles também são os guardiões das ideologias e dos grandes movimentos religiosos e filosóficos. Sua tarefa é garantir que a evolução da humanidade como um todo prossiga na direção correta. Eles não lidam com indivíduos, mas sim com a alma dos povos.

Na Cabala, os Principados estão ligados à Sephirah Netzach (Vitória ou Eternidade). Netzach representa a energia, a paixão e a força dos instintos coletivos que movem a sociedade. Os Principados canalizam essa energia, inspirando a humanidade a lutar por seus ideais e a construir civilizações duradouras.

Arcanjos

Os “Arcanjos” (Archangeli), ou “Anjos Principais”, são o coro mais conhecido, embora frequentemente mal compreendido. Sua função é a de serem os grandes mensageiros de Deus para a humanidade em momentos de importância crucial. Enquanto os anjos do coro inferior lidam com mensagens individuais, os Arcanjos entregam revelações que afetam o destino de muitos.

Figuras como Gabriel, que anunciou a missão de Maria, e Raphael, que guiou Tobias, são exemplos de sua atuação. Eles são os generais que lideram os anjos em missões específicas e servem como a principal interface entre a hierarquia celestial e a consciência profética humana.

Na Cabala, os Arcanjos são associados à Sephirah Hod (Glória ou Esplendor). Hod é a esfera do intelecto concreto, da comunicação e da magia. Os Arcanjos, portanto, traduzem a inspiração abstrata de Netzach em formas compreensíveis, como palavras, símbolos e profecias, permitindo que a humanidade entenda a Vontade Divina.

Anjos

O último e mais próximo coro da humanidade é o dos “Anjos”. Sua função é a mais direta e pessoal. Eles são os ministros e guardiões designados para cada indivíduo, lugar ou situação específica. O conceito popular de “anjo da guarda” deriva diretamente da função deste coro.

Eles se preocupam com os detalhes da vida humana, oferecendo proteção, inspiração e orientação no dia a dia. São eles que levam as preces individuais ao Céu e que trazem as pequenas graças e sincronicidades que nos guiam em nosso caminho. Sua tarefa é garantir que cada alma individual receba o amparo necessário para cumprir sua jornada terrena.

Na Cabala, o coro dos Anjos está ligado à Sephirah Yesod (O Fundamento). Yesod é a esfera do plano astral, a fundação etérica sobre a qual o mundo material é construído. Os Anjos operam a partir deste plano, influenciando os sonhos, a intuição e os eventos do mundo físico para nos guiar e proteger. Eles são a manifestação mais tangível da presença e do cuidado de Deus na vida de cada ser.

Espiritualidade e Metafísica - Tibério Z

Prof. Tibério Z

Com mais de 35 anos de experiência em espiritualidade e desenvolvimento pessoal, atuo como professor, autor e mentor, ajudando pessoas a ampliar seu conhecimento e a evoluir em sua jornada pessoal e espiritual.

Minha formação inclui graduação em Filosofia e pós-graduação em Acupuntura, Naturopatia e Psicoterapia, reunindo conhecimento acadêmico e prática para oferecer ensinamentos claros e aplicáveis.